Diagnosticada com depressão poucos meses antes do início da pandemia, Lara Zanini sentiu a sua saúde mental piorar de vez quando entrou no ensino médio. A nova realidade de isolamento social junto com a pressão de treinar para os vestibulares agravou a angústia que ela já carregava.
“Pesou um pouco porque você nunca sabe o que vai acontecer, você pode estudar o quanto for, mas não sabe se vai passar ou não. Você quer deixar os pais e a família feliz, quer se orgulhar de si mesmo e passar em faculdades boas que tenham o seu perfil, e fica muito essa questão de vai acontecer ou não vai”, diz a jovem de 19 anos.
O caso dela não é exclusividade. Além de afirmar que tem vários amigos enfrentando situações similares a sua, dados da pesquisa Covitel (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia) demonstram que o número de jovens diagnosticados com depressão praticamente dobrou depois da pandemia. A prevalência do transtorno em jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos era de 7,7% e saltou para 14,8%.
O psiquiatra Guilherme Polanczyk diz que esse aumento é resultado de um conjunto de situações que causaram grande estresse.
“O medo da doença, perdas econômicas, estresse familiar, luto e dificuldades na escola são fatores que têm efeitos muito particulares em cada pessoa”, afirma o psiquiatra.
Um estudo publicado pela revista científica ‘Nature’ mostra que isso também se deve a alteração das expectativas dos adolescentes em relação às suas oportunidades futuras. A pesquisa ‘Bem-estar psicossocial de adolescentes um ano após o surto de COVID-19 na Noruega’ revela que o cenário pessimista desafiou as crenças básicas dos adolescentes sobre viver em um mundo seguro e controlável.
“A recessão econômica atinge quem está na fase inicial fase de sua carreira, tornando a entrada no mercado de trabalho mais difícil”, escrevem os autores.
Os desafios, no entanto, são constantes e assumem formatos diferentes. “Agora que a pandemia deu uma aliviada e voltei ao presencial eu tive outra piora. Tenho medo de ficar doente e de alguém da família ficar doente. Eu já estava acostumada e produzia muito em casa, agora tenho que ir para faculdade presencial e isso me sobrecarrega muito”, diz a estudante de direito.
Identificar e apoiar
Com sintomas de ansiedade desde os 11 anos de idade, o diagnóstico ajudou Lara a esclarecer outras dificuldades que vinha apresentando na escola, como notas baixas. Ao expor para a instituição de ensino a situação, a jovem encontrou muito apoio e enfrentou a recuperação escolar de maneira tranquila.
Polanczyk, que também é professor de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Faculdade de Medicina da USP, diz que a escola tem que ser um espaço também de promoção para saúde mental.
“Com esses números que a gente tem, em termos de saúde mental, uma escola que não der conta disso vai ter só metade dos seus alunos, porque uma escola que exclui aqueles que tem problemas de saúde mental exclui uma parcela grande.”
O médico lembra das possibilidades que os professores têm no dia a dia para identificar comportamentos que merecem atenção, já que a escola é o principal ambiente de interação das crianças e jovens.
“Se a gente consegue intervir, pode tanto evitar problemas quanto ajudar. É um espaço que é também é responsável pela saúde mental das crianças e dos adolescentes. Podemos pensar em estratégias para ter um clima entre os alunos e professores adequado e abordar saúde mental e habilidades socioemocionais, como empatia, cooperação”, sugere.
g1