O anúncio de uma política de subsídios para reduzir cerca de 10% no preço de carros que custam até R$ 120 mil pegou a equipe econômica do governo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de surpresa. Segundo apurou o Poder360, nem o Ministério da Fazenda, nem o do Planejamento participaram da elaboração do programa ou sabiam com antecedência que este seria anunciado.
O governo federal anunciou um corte do IPI (Imposto sobre Produto Industrializado) e o PIS/Cofins que reduzirá de 1,5% a 10,96% o preço de carros de até R$ 120 mil. Os modelos mais baratos hoje custam R$ 68.990, segundo informações dos sites oficiais das principais empresas. O desconto máximo será de R$ 7.561 no valor do veículo, que passará a valer R$ 61.429. O governo avalia que as empresas poderão reduzir para menos de R$ 60.000.
Para viabilizar essa redução, o governo cobrará menos impostos das indústrias. Diminuirá o IPI e o PIS/Cofins, mas custo fiscal da iniciativa ainda é incerto. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, terá até 15 dias para apresentar os dados. O Planalto diz que a medida será temporária, mas não há um prazo definido pelo governo.
Além de Haddad, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, também precisará correr, porque sua área que cuida do Orçamento. Tebet está passando a semana no Nordeste para eventos do PPA (Plano Plurianual) participativo e não foi consultada ou tampouco sabia quando o anúncio seria feito.
Cálculo Incerto
Para calcular o impacto fiscal da medida, a equipe econômica precisa saber qual será o corte no IPI, qual será o PIS/Cofins e dentro de quais parâmetros, por quanto tempo e para quais modelos de carro, pelo menos. Até a noite de 4ª feira (26.mai), o plano do governo não era anunciar nada de concreto sobre preços de veículos.
Há integrantes da equipe econômica que ainda não sabem qual é o desenho técnico do programa até agora, 24h depois do anúncio conduzido pelo vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin. O custo deve ser bilionário, mas sem o detalhamento, a conta não pode ser feita, deixando o programa como uma espécie de “cheque em branco” para o Planalto.
Cálculo da Bright Consulting estima um custo fiscal de R$ 4 bilhões por semestre (ou R$ 8 bilhões por ano). A consultoria utilizou o preço médio dos veículos, analisaram os valores mais caros e mais baratos, bem como as eficiências energéticas.
“Considerando-se que os veículos mais baratos têm mais conteúdo local e, em média, uma melhor eficiência energética (motores de baixa cilindrada e potencial) eles devem conseguir o topo do desconto (de 10,96%)”, declarou Murilo Briganti, sócio da consultora. A Bright Consulting escalonou o desconto para os demais veículos até R$ 120 mil.
Gabriel Leal de Barros disse que o cálculo de renúncia fiscal dependerá das alíquotas, e da composição da redução de impostos (IPI e PIS/Cofins). Além disso, declarou que o governo ainda precisa explicar como será definida o gasto tributário por modelo do carro.
O economista, que já trabalhou na IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, afirmou que a medida é “mais uma” que vai na “contramão” do ajuste fiscal prometido pelo governo. “Se fala em spending review (revisão dos gastos), principalmente das renúncias fiscais. Cadê esse trabalho sendo feito agora?”, declarou Leal de Barros.
Golpe no controle de gastos
Esse chamado “cheque em branco” terá um efeito bilionário nas contas públicas no momento em que Haddad defende um “spending review” do Estado, principalmente dos gastos tributários.
Ao mesmo tempo em que o governo promete combater o que considera privilégios setoriais, ele reduz impostos às montadoras para atingir o objetivo de ter carro abaixo de R$ 60.000.
Nos primeiros governos Lula, o carro mais vendido era o Gol, da Volkswagen, e custava em torno de R$ 18.000 o modelo mais novo. A preços atuais, o veículo equivale a pouco menos de R$ 60.000.
Com as medidas anunciadas pelo Planalto, a Fazenda e equipe econômica têm dificuldades de manter a coerência no ajuste fiscal. Há grande empenho para o aumento de gastos, mas o aumento da arrecadação é incerto. O ganho com o voto de qualidade (previsto em R$ 50 bilhões) do Carf, por exemplo, deve ser revertido pelo Congresso.
O deficit previsto para 2023, que antes poderia chegar a 0,5% do PIB, segundo Haddad, passou para 1,3%, mas o governo segue anunciando aumento de despesas sem apontar fontes confiáveis de recursos para custeá-las.
Poder 360