No árido cenário do semiárido brasileiro, onde a luta pela sobrevivência é constante, o jumento emerge como um símbolo de tenacidade e resistência. Porém, essa resistência está sendo posta à prova de uma maneira alarmante, com o aumento do abate desses animais. Nas últimas décadas, o jumento, outrora utilizado como parceiro de trabalho e companheiro dos habitantes da região, enfrenta uma ameaça iminente de extinção devido à exploração desenfreada e à crescente demanda por suas peles.
O abate de jumentos, com foco na extração de sua valiosa pele, tem gerado preocupações entre os especialistas e defensores dos direitos dos animais. A Dra. Débora Façanha, pesquisadora atuante nessa área, ressalta que os abatedouros, principalmente na Bahia, têm explorado a pele dos jumentos para a produção de colágeno destinado à medicina tradicional chinesa. A magnitude desse comércio cruel e insustentável tem resultado na aceleração do declínio populacional desses animais no Nordeste, ameaçando torná-los uma espécie em perigo de extinção.
Segundo dados do Ministério da Agricultura e Agropecuária, mais de 78 mil jumentos foram abatidos na Bahia entre fevereiro de 2021 e junho de 2022. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou uma alarmante redução de 38% na população desses animais entre 2011 e 2017. Embora somente em 2018 tenha sido implementada a primeira política pública voltada à preservação da espécie, tal iniciativa foi momentaneamente suspensa em 2019 e somente retomada após árduos esforços em 2022. No entanto, a pesquisadora Débora Façanha observa com preocupação que órgãos de controle e o próprio Ministério não estão cumprindo a determinação de proteção, alegando precedentes que autorizam o abate.
A situação transcende a mera preocupação com a conservação da biodiversidade. O médico veterinário da Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa), Sidnei Sakamoto, alerta para os riscos de introdução de zoonoses associadas a essa prática. Uma doença de particular destaque é o mormo, altamente perigoso para os seres humanos e com altas taxas de letalidade.
Nesse contexto, organizações não-governamentais (ONGs) têm assumido um papel crucial na luta pela sobrevivência do jumento no cenário do semiárido brasileiro. Sua missão inclui o combate ao tráfico de jumentos para abate, bem como a conscientização pública sobre a importância da preservação desses animais como parte integrante do ecossistema e da cultura local.
À medida que essa discussão ganha destaque, é vital que a sociedade, as autoridades e os setores envolvidos reavaliem o impacto de suas ações no delicado equilíbrio da natureza e no respeito aos seres vivos que compartilham este planeta. O jumento, outrora símbolo de resiliência, merece mais do que nunca um esforço conjunto para preservar sua existência e legado no cenário semiárido brasileiro.