Há uma semana “percorrendo o estado para ouvir as demandas da população”, o ex-juiz federal Sergio Moro (União Brasil) segue sem definir a que cargo concorrerá nas eleições de outubro. Decisão que, segundo ele, só será tomada em julho, no período das convenções partidárias. Enquanto as convenções não chegam, no entanto, o pré-candidato diz estar montando um robusto “plano de governo”, baseado em cinco eixos: combate à corrupção; segurança; geração de empregos; saúde e educação; e princípios e valores.
Debater o estado com a população e preparar um programa de governo são missões mais características de um pré-candidato ao Poder Executivo (governador) do que ao Legislativo (senador ou deputado). Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, no entanto, Moro disse que poderá cumprir seu plano, também, no Legislativo, pois pretende ter, no Congresso (caso essa seja a escolha) uma papel muito maior “que ficar apenas discutindo leis ou trazendo verbas para determinadas regiões ou para determinados projetos”.
Na entrevista, Moro avaliou as idas e vindas de sua curta carreira política, da saída da magistratura para assumir o Ministério da Justiça, passando pelo projeto presidencial, o recuo para uma candidatura em São Paulo e o indeferimento de seu domicílio eleitoral, que o fez pré-candidato no Paraná. O ex-ministro comentou como tem trabalhado a construção da candidatura, os critérios para a decisão final e a construção de alianças com outras legendas.
Moro ainda respondeu sobre o cenário político nacional, o governo Bolsonaro, a tendência de polarização na eleição presidencial e o fracasso na articulação para a construção de uma “terceira via”, da qual ele próprio já tentou ser o representante.
Vamos começar voltando no tempo, até 2018, para perguntar se o senhor se arrepende de ter deixado a magistratura na virada daquele ano para 2019, para então assumir o Ministério da Justiça?
Não me arrependo. Acolhi o convite com a expectativa de contribuir para uma transformação para o Brasil, de implementar uma agenda importante. Em parte, a gente foi bem sucedido, principalmente no que se refere ao combate ao crime organizado e à redução da criminalidade violenta. A gente conseguiu até bons indicadores em 2019, comparativamente com 2018, e uma série de programas que implementamos, como o Vigia nas Fronteiras e a Rede Nacional de Perfis Genéticos. No entanto, a minha agenda anticorrupção acabou não sendo possível ser realizada por questões políticas e deixei o governo porque eu entendia que tinha que manter a minha coerência. Então eu, no fundo, acabei me desapontando, mas não me arrependendo. A minha volta agora ao Brasil e o ingresso na política é para levantar essas bandeiras, que não podem ser abandonadas pela população ou pelo mundo político.
Mas se o senhor tivesse ficado na magistratura, hoje poderia estar no Supremo Tribunal Federal ou no TRF4. E evitaria esse julgamento do STF, que por conta da sua ida ao Ministério da Justiça considerou o senhor suspeito para julgar Lula e a Lava Jato aqui no Paraná.
Não sei se evitaria. É muito difícil imaginar o que poderia ter acontecido se tivesse ficado. No fundo houve uma reação muito grande contra o combate à corrupção e é possível que o resultado tivesse sido o mesmo. O grande ponto é você continuar defendendo aquilo que você acredita e manter a sua coerência. Então, eu sempre me portei dessa forma. Eu sou um lutador, não vou desistir. Se estivesse na magistratura e tivesse acontecido toda essa reação, provavelmente estaria lá sem a possibilidade de ter um papel significativo na transformação do Brasil, que é o que interessa a todas as pessoas.
Quando o senhor sai do governo, projeta-se a eclosão de uma grande crise em Brasília. O senhor saiu falando em interferência na Polícia Federal e até em falsidade ideológica do presidente Bolsonaro, que disse que teria a sua assinatura na exoneração do delegado Valeixo (e o senhor disse que não assinou). Foi aberto um inquérito, o senhor depôs por horas na Polícia Federal que, neste ano, concluiu que não houve interferência. Esse inquérito está no Supremo sem previsão de quando vai à PGR ou quando vai ser julgado. Como o senhor vê o encaminhamento desse caso?
Eu sempre falei a verdade. Tudo o que eu falei ali foi confirmado depois, inclusive por declarações do próprio presidente da República. Eu nunca afirmei que o presidente havia cometido um crime, na ocasião. Isso foi uma iniciativa do procurador-geral da República, que quis abrir um inquérito para apurar aquele fato. Mas na ocasião eu nunca falei que ele havia cometido um crime. Eu disse que havia uma mudança na direção da Polícia Federal com a qual não concordava, por motivos que eu não poderia concordar. Isso foi confirmado, inclusive, por declarações do próprio presidente. Então, em relação a esse inquérito, eu nunca me preocupei com ele. Segue o seu curso normalmente. No fundo, o que a gente quer é olhar para frente.
No auge da Lava Jato e mesmo depois, o senhor sempre destacou a importância de a opinião pública acompanhar todo o processo, se manifestar e dar respaldo ao trabalho que estava sendo feito. Com tudo que aconteceu e com o esvaziamento da Lava Jato, o senhor acha que a opinião pública mudou em relação à Lava Jato e por quê?
A opinião pública é favorável ao combate à corrupção e é mesmo favorável à Lava Jato. Houve, sim, um enfraquecimento no âmbito do mundo político, do mundo institucional. E isso eu vejo com grande pesar. Isso nunca foi uma batalha pessoal, buscando o mérito individual. Isso é uma luta para transformar o país. Então, quando a gente vê arrefecer o combate à corrupção num país como o Brasil, que tem graves problemas nessa área, quem está perdendo é a população. É o dinheiro que é desviado e que poderia ter ido para uma obra pública, que poderia ser utilizado para mais leitos em hospitais ou para melhorar o sistema de educação. É uma constatação que nós tivemos revezes. Por exemplo, quando o Supremo revê a execução em segunda instância, soltando vários criminosos, isso é ruim para o país. Quando o Supremo começa a anular casos de pessoas que cometeram crimes, isso é ruim para o país. Não é uma questão individual. Agora, eu não sou uma pessoa que vai ficar lamentando nos cantos. A questão é saber o que você vai fazer a respeito. Eu vou continuar falando a verdade e vou defender as bandeiras e reformas que precisamos. Não existe nenhum país no mundo que prosperou economicamente baseado em fraude ou em corrupção.
Como o Brasil pode ou deveria evoluir para esse combate à corrupção ser efetivo e contínuo, não dependendo de um grupo específico e independente de Sergio Moro, mas para que isso seja intrínseco nas investigações e no trabalho do Judiciário?
No meu retorno aqui ao Paraná estamos preparando propostas em cinco grandes eixos. Um desses eixos é a ideia de um Paraná livre de corrupção. A gente fica pensando que precisa de grandes reformas no Congresso para combater a corrupção e, de fato, algumas delas são necessárias. Mas você precisa também agir localmente. Tem muito o que você pode avançar nessa área. Então, por exemplo, o fim do foro privilegiado aos políticos, que funciona como uma blindagem quanto à efetiva responsabilização e prejudica aquilo que a gente chama de accountability. A gente precisaria ter a volta da execução da condenação em segunda instância, porque precisa ter um processo com começo, meio e fim em prazo razoável. Se não, não adianta nada. A gente está discutindo uma lei de proteção às investigações, porque a gente vê uma certa intimidação, tanto da polícia como do Ministério Público, para poderem realizar o seu trabalho de maneira independente. Tem que pensar em como é que você protege um delegado de polícia ou um diretor da Polícia Federal para que ele possa fazer o trabalho sem sofrer retaliações ou interferências. De outro lado, também tem medidas que são materiais. Por exemplo, criar delegacias especializadas no combate à corrupção em cada estado, na Polícia Federal ou na Polícia Civil, com autonomia e estrutura. Isso é fundamentalmente importante. Um instrumento muito relevante que outros países utilizam com sucesso é um programa rigoroso de whistleblowers, que são aqueles denunciantes do bem. São pessoas que, tendo ciência de ilícitos, fraudes corporativas ou crimes de corrupção, denunciam o fato e a lei as protege contra retaliações. Também pode se pensar em dar recompensas. Não é a mesma coisa que colaboração premiada, porque esses informantes são informantes do bem, eles não estão envolvidos nos ilícitos. Foi uma medida tomada nos Estados Unidos logo após a crise de 2008 no mundo corporativo, com a lei Dodd-Frank. A mesma coisa você pode fazer aqui no Brasil. Durante o meu período como ministro, nós aprovamos uma lei prevendo a possibilidade, a proteção e recompensas a whistleblowers no âmbito da administração pública federal, estadual e municipal, mas isso não foi devidamente implementado. É uma coisa que poderia ser feita de imediato aqui, em estatais, sociedades de economia mista ou empresas públicas do Paraná, federais ou estaduais.
Ainda sobre o combate à corrupção, na semana passada, o presidente Bolsonaro voltou a admitir que existe a possibilidade de ter corrupção em seu governo por meio de desvios de verbas dos ministérios. Mas, segundo ele, não seria possível acompanhar todos os envios de dinheiro às ações das pastas pelo país. Como o senhor avalia uma declaração dessas vinda do presidente da República?
A liderança tem uma grande responsabilidade. Tem que, primeiro, dar o exemplo, e depois construir os mecanismos institucionais para prevenir e combater a prática de corrupção. Corrupção é um crime bem racional, diferente, por exemplo, de um assassinato, cometido muitas vezes por motivos passionais, ciúme ou animosidade. A corrupção é um crime extremamente racional, baseado em um juízo de risco e de oportunidade. Então você tem que diminuir a oportunidade e aumentar os riscos. Melhorar a governança. Não é tudo só repressão. Algo que a gente tem de positivo como um produto da Lava Jato foi a Lei das Estatais de 2016, que melhorou a governança das estatais brasileiras, inclusive da Petrobras, estabelecendo critérios técnicos para nomeação dos cargos. Outra questão é uma transparência ativa maior. Você precisa também ter o aspecto repressão, porque não adianta nada ter a identificação do malfeito se você não tem a punição. Isso a gente estuda no direito penal: as pessoas aprendem pelo exemplo. Punir quem comete um crime é algo importante, como um efeito preventivo para os demais. Durante a Operação Lava Jato, a Justiça pode operar com independência e autonomia. O resultado ter mais de 180 pessoas condenadas e muitas indo para a prisão cumprir pena, inclusive pessoas graúdas como o ex-presidente da Câmara [Federal], o ex-presidente da República, donos de grandes empreiteiras. São pessoas poderosas que foram julgadas e reputadas culpadas. Isso tem um impacto para avançar. Infelizmente, o que a gente viu nos últimos anos foi um retrocesso, uma diminuição desse impulso, o que faz também que gere oportunidades e diminui os riscos daquelas pessoas que querem voltar a praticar crimes. Eu acho que a responsabilidade maior é sempre da liderança. Então, sempre tem o que se pode fazer. Claro que o presidente não pode controlar tudo, mas ele tem que atuar para controlar o que for possível.
A segurança pública, uma área primária para o senhor, pela experiência prévia, também está no foco de Sergio Moro candidato?
Outro eixo temático é exatamente esse, um Paraná seguro para as famílias. Hoje nós temos a proximidade do fim da pandemia e voltou a haver uma grande circulação de pessoas. Isso também aumentou a criminalidade, inclusive criminalidade de rua, gerando uma série de preocupações. Durante o meu período de Ministério da Justiça, a gente conseguiu reduzir a criminalidade. Em 2019 nós tivemos 22% a menos de assassinatos no Brasil, segundo dados do Ipea: cerca de 10 mil brasileiros a menos foram assassinados em 2019 em comparação com 2018. As causas são variadas, mas tenho certeza que alguns dos programas que nós criamos naquela época tiveram impacto. Retomamos o programa da Rede Nacional de Perfis Genéticos, que é uma modernização da investigação criminal. Claro que a gente tem que ter o policial na rua para prevenir os crimes. Pode se pensar também em vigilância eletrônica, mas quando você tem um crime grave, por exemplo, de assassinato, você precisa ter uma investigação eficaz e precisa tirar o criminoso da rua. Essa rede nacional de perfis genéticos, basicamente, é ir no local do crime e recolher o material biológico, que vai ser da vítima e, provavelmente, do autor do crime, e tirar uma moderna impressão digital. Ninguém tem o DNA igual ao do outro. Você insere no banco de dados e começa a fazer cruzamentos não só com o material coletado em outras cenas de crime, mas também material coletado da população carcerária. Esse foi, por exemplo, o mecanismo que permitiu a resolução daquele grave assassinato da Raquel Genofre aqui no Paraná, que ficou impune por 11 anos. Não se descobriu quem era. Mas quando a gente retomou esse programa da Rede Nacional de Perfis Genéticos, acabou sendo coletado o perfil genético de um preso em São Paulo, cruzado com os dados colhidos na época do assassinato dela e deu a correspondência. A gente não pode deixar que um assassinato dessa espécie fique impune por tantos anos, não só por uma questão de justiça, mas de risco para a sociedade. Então uma das propostas é ampliar o rol de pessoas que estão sujeitas à coleta do perfil genético. No Brasil, ainda é muito baixo: somente pessoas responsáveis por crimes hediondos com resultado morte. Nós precisamos ampliar esse rol para atingir toda a população carcerária. Para ter uma ideia, esse programa estava abandonado. Quando a gente assumiu, tinha mais ou menos 8 mil perfis genéticos. Ao final do ano, nós tínhamos colhido 67 mil perfis genéticos. Mas se a gente for comparar o número de perfis genéticos que existem em programas de outros países, o nosso ainda é muito baixo. No Reino Unido são 6 milhões no banco de dados. Isso significa que a possibilidade de você identificar o criminoso com um banco de dados desse tamanho é muito grande. Essa é uma das medidas que estamos propondo nesse eixo temático, mas tem outros propósitos.
Pode descrever os demais eixos temáticos planejados?
Nós vamos discutir e revelar as propostas com o tempo, mas os eixos são: um Paraná livre de corrupção, um Paraná seguro para as famílias (que é o eixo da segurança pública), um Paraná da geração de emprego e da produção, dentro de uma economia dinâmica. A gente vê um mundo em transição, principalmente uma transição energética muito grande. E o Paraná é um polo importante de produção do Brasil, um dos celeiros de alimentos do país e do mundo. Esse mundo cada vez mais demanda alimentos, mas o Paraná não pode ser só um celeiro de alimentos. Tem que ser um celeiro também de tecnologia e de empregos. Outro eixo temático é um Paraná de saúde e educação ao alcance da palma da mão, que faz uma referência aqui aos avanços tecnológicos que foram impulsionados com a pandemia, evento trágico, evidentemente, que vitimou mais de 600 mil brasileiros. Mas do outro lado, não que isso compense, evidentemente, mas trouxe oportunidades de avanço tecnológico muito grandes. Hoje você tem condições muitas vezes de providenciar saúde e educação de ponta para todos os brasileiros, ou pelo menos para todos os paranaenses, falando da nossa realidade. E o eixo temático de um Paraná de princípios e valores, que aí tem muito a ver com a discussão de determinadas pautas, princípios e valores, como a proteção das liberdades civis, das liberdades religiosas, a proteção da família. Todas essas propostas vão ser melhor detalhadas e divulgadas oportunamente.
Está fazendo uma semana da coletiva em que o senhor anunciou que está de volta à política do Paraná, mas que ainda não definiu a que cargo. O senhor disse que percorreria o Estado ouvindo a comunidade. Já começou esse trabalho? E circular o Estado ouvindo proposições, demandas da população e elaborar um programa com esses cinco eixos referentes ao Estado não é uma ação muito mais de Executivo do que de Legislativo, enquanto estão sugerindo que o senhor seja candidato ao Senado ou à Câmara Federal? Como é que um deputado federal – entre 500 – vai conseguir implantar esse programa que o senhor está propondo?
Eu acho que tem os dois aspectos. Primeiro a gente quer circular para ouvir as pessoas e essas propostas não estão fechadas. A gente tem que ter a humildade de ouvir as pessoas e aprimorar as propostas ou, eventualmente, até deixar de lado. Esse papel você pode cumprir tanto no Legislativo como no Executivo. O próprio Legislativo influencia o Executivo. O papel de um deputado ou de um senador é muito mais do que ficar apenas discutindo leis dentro do Congresso. É muito mais do que, infelizmente, se tornou um pouco hoje de ficar trazendo verba para determinadas regiões ou para determinados projetos. É também fiscalizar o Executivo, cobrar medidas e exercer sua influência política. Por exemplo, defender a criação de delegacias especializadas em corrupção com autonomia dentro dos estados, ainda que você seja eventualmente um senador ou um deputado, você pode fazer seja através de uma proposta de mudança de lei, seja através de uma cobrança, de uma influência positiva junto ao Poder Executivo do Estado. Então, no fundo, existem as várias alternativas. Eu ainda não fechei com o partido e também é uma decisão que eu quero fazer depois de ouvir a população, a que cargo que eu devo concorrer.
Trazendo agora o questionamento para a sua trajetória política. No ano passado, o senhor nos Estados Unidos, alguns aliados vão lhe buscar, lhe trazem para o Podemos para ser pré-candidato a presidente da República. O senhor começa a circular o país com essa pré-candidatura, tentando quebrar a polarização entre Bolsonaro e Lula, e assim fica até abril deste ano, no prazo final para filiação partidária, quando decide pela mudança para o União Brasil. Por que essa troca do Podemos, depois de toda essa construção em meses, para o União Brasil aos 45 minutos do segundo tempo?
A ideia foi buscar um caminho para continuar o projeto nacional. O Podemos tem lá seus méritos, mas é uma estrutura partidária menor. E nós percebemos ali, por uma série de questões internas, que não haveria condições de prosseguir dentro da candidatura presidencial. Eu tenho uma série de queixas que poderia fazer. Acho que não é apropriado ficar reclamando. A ideia da transferência para o União Brasil foi exatamente perseguir o projeto nacional. Nós fomos realmente com uma expectativa de conseguir a legenda presidencial, me foi colocado no entanto que havia uma série de óbices para isso, e a gente buscou construir um novo projeto. A gente não pode desistir. A mesma questão quando estava lá nos Estados Unidos, no setor privado. Mas você sente aquele chamado da vida pública no sentido de “olha, a luta não acabou ainda, você tem que contribuir”. O país está numa situação difícil, não só na economia. O principal problema que eu sinto hoje no Brasil é uma certa crise ética, uma crise moral. A gente tenta muitas vezes tenta fazer essa dissociação entre economia, ética e moral, mas elas caminham juntas. Nos estudos mais recentes sobre ciência política tem uma correlação muito clara entre a qualidade das nossas instituições, que dependem muito da questão ética, com o desenvolvimento econômico. E a gente vê o Brasil numa crise enorme, que, sim, é econômica. As pessoas sofrem no bolso, têm dificuldade de comprar alimentos por conta da inflação, dificuldade na atividade econômica por conta dos juros altos. Acima de tudo, você vê as pessoas desapontadas por entender que o Brasil passa por uma crise ética. E acho que se você trabalhar para resolver esse ponto, ajuda os demais. Claro que precisa também tomar as medidas econômicas certas – isso faz parte das nossas propostas. Mas você não pode cuidar do bolso e abandonar a alma.
No União Brasil, o senhor até citou que chega tentando manter o projeto nacional, mas de cara colocam que o convite era para disputar algum cargo em São Paulo. Isso foi acertado antes ou depois da sua transferência de partido? E, também: quando o senhor deixou o Podemos, na última pesquisa de intenção de votos divulgada¹ o senhor pontuava com 9%. Já o União Brasil mantém a pré-candidatura do presidente do partido, Luciano Bivar, que até agora não passou de 1%². Foi a escolha certa do partido ao projeto nacional, numa estrutura bem maior, num partido com recurso de fundo partidário, com tempo de TV? Largando o senhor com 9%, não era uma possibilidade de sucesso muito maior?
Essas foram as escolhas partidárias. O pré-candidato a presidente da República é o Luciano Bivar. É um partido grande, que tem tempo de TV, recursos para bancar uma candidatura presidencial e o partido está fazendo essa aposta. Nós estamos construindo propostas para essa pré-candidatura presidencial, eu estou inclusive contribuindo. Eu não posso chegar num partido e dizer “eu mando no partido”. Eu não mando no partido. Então, foram as opções ali tomadas. Mas também fico satisfeito em poder contribuir e seguir também o meu projeto, que é dentro do partido, mas também diz respeito às minhas escolhas. No fundo, a ideia é dar um passo atrás para a gente conseguir dar passos mais sólidos lá na frente. A percepção das pessoas pode ser que “abandonou a candidatura presidencial para ser candidato a alguma outra coisa num outro partido”, mas não. A percepção que nós tínhamos era que nós não teríamos a candidatura presidencial dentro do Podemos.
Foi uma terceira opção?
Nunca foi a terceira opção. O projeto era presidencial. Quando eu vou para o União Brasil, o fato de eu estar em São Paulo ou no Paraná para um projeto presidencial é indiferente. Houve um pedido para transferência do domicílio do partido porque se caso não desse certo o projeto presidencial, a ideia era a construção de um projeto nacional a partir do maior eleitorado do país, de São Paulo. Nós fizemos essa opção a pedido, estávamos muito bem calçados juridicamente e fomos até surpreendidos por essa decisão do TRE de São Paulo. No próprio julgamento eles chegam a afirmar que o pedido estava parado na jurisprudência, mas era o momento de mudar essa jurisprudência. Quando houve essa decisão, a nossa opção imediata foi então voltar ao Paraná e posso dizer, com muita tranquilidade, Roger e Luciana, foi uma grande alegria. Paraná é a minha terra, com a minha gente, onde eu nasci, cresci, constituí família. Tive a oportunidade no Paraná de atuar em vários grandes casos, como o Banestado; casos envolvendo grandes traficantes, como o Fernandinho Beira-Mar; e nesse caso em particular, que foi a Lava Jato e que acabou mudando a história do Brasil a partir do Paraná.
O seu domicílio eleitoral em São Paulo foi indeferido, o da sua esposa foi deferido. Quando o senhor vem para cá, agora tem gente querendo questionar o seu domicílio eleitoral no Paraná, tem gente querendo impugnar o seu registro no próprio partido, tem gente querendo impugnar sua candidatura no dia em que for registrada. O senhor está vendo o sistema político atuando contra?
Tem muita gente boa no sistema político, mas tem gente também que tem medo da gente ter um discurso político diferente pela integridade, pela transparência. A política tem que ser a política do bem comum. Governar é atender o interesse comum, o bem comum. Então, tem muita gente que tem medo de uma candidatura minha, porque ela implica algo diferente do que a gente vê normalmente nesse espectro da política. Você encontrar um candidato que fale que é contra a corrupção é absolutamente normal. Não vai encontrar nenhum político que não fale isso, embora tenha muitos que se omitem quanto ao tema. Agora, no meu caso é diferente, porque eu tenho um passado. Eu tenho credibilidade para falar que eu lutei contra a corrupção, não virei o rosto, não varri para debaixo do tapete e encarei com todos os riscos que aquilo envolvia. Quando eu falo que nós temos que combater a criminalidade organizada, reduzir o crime violento, é o que eu já fiz. Quando a gente, por exemplo, fez em São Paulo a transferência e o isolamento das lideranças do PCC em presídio de segurança máxima, ninguém tinha feito isso antes. Isso é algo que devia ter sido feito lá em 2006, depois daqueles atentados terroristas, e ninguém fez, houve uma política de acomodação. A primeira coisa que a gente fez foi isolá-los. Uma decisão difícil, que envolve uma série de riscos, mas foi bem planejado, não houve consequências para a população. Então quando eu falo que a gente tem propostas para combater a corrupção e o crime organizado, eu tenho credibilidade na minha história para afirmar isso. E tem muita gente que tem medo porque boa parte do mundo político está acomodado com o status quo. Tem gente querendo mudar, mas tem muita gente que quer que as coisas permaneçam como sempre estiveram, com corrupção e desigualdade.
Voltando a falar um pouco do nosso eleitorado paranaense, temos assuntos que mexem muito com a opinião pública, além dos já mencionados. Um deles é o pedágio. Antes do lançamento do edital de licitação, uma ida ao litoral, por exemplo, já está calculada em mais de R$ 20. Como o político Sergio Moro poderia atuar e como se posiciona em relação a um tema tão caro aos paranaenses?
Os contratos de concessão anteriores foram mal feitos. Geravam um dos pedágios mais caros do país, com pouco retorno, e boa parte das promessas feitas pelas concessionárias não foram cumpridas. Havia uma promessa, por exemplo, que seria duplicada a Rodovia do Café, de Curitiba até o norte do Paraná, e isso acabou não sendo feito. O pedágio é uma forma de você financiar a ampliação e a boa conservação da malha viária. Faz sentido, mas tem que ser feito de maneira adequada, para que o preço não fique tão alto, o que impacta não só na capacidade das pessoas se locomoverem, mas nos próprios custos de produção do Paraná. Conceder de novo à iniciativa privada com pedágio, em princípio, não é ruim. Tem que se analisar a forma para que o preço não fique proibitivo, que haja um retorno adequado à população e evitar também corrupção. Eu tive um processo que chegou a passar pela minha mão, depois eu tive que mandar para outro juiz, de acusações de funcionários públicos recebendo suborno, propina, para beneficiar concessionárias em contratos de concessão. Tanto que houve um acordo de leniência feito pelo Ministério Público com uma das concessionárias que resultou na queda do preço do pedágio na Praça de Jacarezinho. As discussões que estamos tendo no país têm que ser muito pragmáticas. Conservar e ampliar rodovias têm um preço. Quem vai pagar vão ser os impostos que são colocados para toda população, por exemplo IPVA e ICMS, ou você vai ter uma cobrança via pedágio? A via pedágio faz sentido porque quem usa a rodovia acaba financiando, mas não pode ser da forma feita antes, com preços exorbitantes, corrupção e baixo retorno à população.
Outro tema caro para os paranaenses (e para o Brasil) nas últimas semanas é o impacto na arrecadação, com a aprovação, pelo Senado e pela Câmara, da proposta para o teto da alíquota do ICMS para energia e combustíveis. Como o senhor avalia esse impacto aqui para o Paraná e como resolver esse impasse?
O preço dos combustíveis está exorbitante, está impactando a população. No fundo, você tem uma inflação de alimentos também, que acaba prejudicando a população em geral, inclusive aquela que sequer tem condições de ter um veículo motorizado. Então discutir formas de redução do preço é válido e uma das formas é a redução dos tributos incidentes. O grande problema é que os estados ficaram muito dependentes da tributação em cima de combustíveis e energia. Essa mudança vai ter um impacto enorme nos cofres públicos, tanto dos estados como dos municípios. Há que se antever uma provável crise fiscal no próximo ano, generalizada no país em relação aos estados, o que é bastante preocupante. Seria ideal que tivéssemos uma discussão mais aprofundada sobre esse tema e pensássemos em maneiras de compensação ou de transição para a diminuição dessa carga tributária. E há dúvidas se, de fato, essa diminuição vai acarretar na diminuição do preço dos combustíveis. São válidas as medidas possíveis para reduzir o preço dos combustíveis, desde que não seja uma manipulação artificial, porque isso se torna um problema lá na frente.
O parlamentar Sergio Moro votaria a favor desse projeto de lei sobre o ICMS no Congresso?
Eu sou muito favorável a discutirmos a redução da tributação sobre combustível e energia porque não só impacta a população, mas também a atividade produtiva. Se você tributa esses insumos usados, por exemplo, numa empresa, isso gera maior dificuldade e maior custo de produção no Brasil. Há uma preocupação em saber o impacto disso nos orçamentos dos estados, porque a conta vai chegar em algum momento. O que eu entendo, porém, é que nós precisaríamos de medidas macroeconômicas diferentes para poder controlar e diminuir a inflação, que está muito alta no Brasil. Não é problema só dos combustíveis, há o problema da cesta básica. O problema é dos produtos que sofreram elevação dentro do mercado internacional. O que leva um pouco mais de tempo e abertura comercial é você aumentar a competição no mercado. Será que o preço do combustível seria desse tamanho se nós tivéssemos um mercado mais competitivo para outras grandes empresas? Será que essa concentração da produção e da comercialização, muitas vezes na Petrobras, não impacta o preço ao qual o consumidor tem acesso? Então, muitas vezes, o que existe é como buscar uma solução aparentemente fácil, que pode não gerar o resultado, mas que tem impacto severo e isso em detrimento do que poderia ser feito. Eu tive reuniões com representantes do sindicato das distribuidoras de combustíveis e um dos pontos colocado ali é que precisaria ter uma rede de distribuição maior de combustíveis. O que acaba encarecendo é a logística, não só das estradas, mas da baixa base de gasoduto e oleoduto no Brasil. Então, é nisso que a gente tem que investir.
O grupo estadual do seu partido tem se reaproximado do presidente Bolsonaro. Na entrevista coletiva da semana passada, o senhor pareceu ter sido muito bem recebido. Há possibilidades de o senhor sofrer certas resistências dentro do União Brasil para construir sua candidatura?
Não vejo essa dificuldade. Primeiro eu fui para o União Brasil convidado pela direção nacional, pelo Luciano Bivar, que tem a pré-candidatura presidencial que eu estou apoiando. Em relação ao quadro estadual, sempre tive boa relação com as pessoas aqui do União Brasil e, na verdade, o que a gente percebe é um certo entusiasmo pela minha volta ao Paraná, que eu compartilho. Então, sinceramente, não vejo dificuldades na construção aqui da política dentro do Paraná. Dentro do partido, posso dizer que tenho sido muito bem recebido.
Na possibilidade de o senhor sair candidato ao Senado, por exemplo, estaria no palanque de um candidato a governador que apoiaria o presidente Jair Bolsonaro?
Essas questões são um pouco prematuras. Preciso definir ainda a qual cargo vou concorrer. E aqui não é uma questão de indecisão, é uma questão de construção. Você não pode chegar e dizer “eu vou ser isso ou você aquilo”. Você vai construir politicamente, vai tomar a melhor decisão dentro desse cenário e, principalmente, ouvindo as pessoas. Então, se eu não tenho essa definição ainda, quanto mais com que alianças políticas serão feitas em torno delas. O que eu posso dizer muito claramente é, do ponto de vista nacional, o apoio à pré-candidatura do Luciano Bivar, como alternativa à polarização.
Dentro dessa construção de qual cargo o senhor vai disputar, o senhor já disse que é uma decisão que será tomada em conjunto com o partido. Quais são os critérios para se chegar a essa decisão e, principalmente, qual é o prazo?
A decisão é minha. Ninguém pode me forçar a tomar nenhuma decisão, então a decisão é minha. Agora, a decisão é tomada em conjunto com o partido e com a população. Já fizemos, por exemplo, algumas pesquisas internas que me deixam bem confortável para qualquer opção que eu eventualmente realize acerca do meu destino político. Mas essa decisão é minha, em primeiro lugar, mas claro que ela é compartilhada também com o partido.
E prazo para isso?
Prazo é nas convenções. Tem uma cobrança muito grande em relação às minhas definições, mas eu vejo que, em relação a outros personagens, nem tanto. Mesmo gente que lidera as pesquisas. Tudo tem o seu período de maturação. Eu não tenho essa ansiedade ou essa necessidade, até porque as pessoas me conhecem, sabem do meu passado, sabem os valores e princípios que defendo. Acho que esse é o ponto mais importante. Então, quer no Executivo, quer no Legislativo, quer no Senado, quer na Câmara dos Deputados, eu vou defender as mesmas ideias. Claro que a gente também evolui, mas a gente tem esse cerne básico de princípios e valores que tem que nos acompanhar na vida política.
O senhor disse que ainda não é hora de discutir alianças, mas desde o dia do indeferimento do seu domicílio eleitoral, o senhor é o fato novo na política paranaense…
Bom para movimentar um pouquinho e deixar mais animado.
…que estava morna. E certamente o senhor e todo mundo que o cerca partidariamente está sendo procurado por inúmeros potenciais aliados ou alguém que queira neutralizar a sua candidatura. Como estão essas conversas de alianças e coligações aqui no Estado? O senhor gostaria de estar ao lado do governador Ratinho Júnior?
O que eu vejo é um Paraná com um potencial gigantesco. Do ponto de vista da economia, do bem estar da população, mas principalmente um Paraná que pode servir como um exemplo para o país, como foi na época da Lava Jato. A Lava Jato só foi possível porque a gente estava aqui no Paraná, com um grande apoio da população. Chegou-se a cunhar aquela expressão “República de Curitiba”, eu diria que seria a “República do Paraná”. A gente escreveu a história do Brasil juntos a partir daqui. Claro que depois isso se espalhou pelo Brasil como fogo na palha. Tivemos grande apoio em São Paulo, na Avenida Paulista a maior demonstração popular da história em apoio ao combate à corrupção. E assim aconteceu nos outros estados. Então, a minha visão é que a gente pode fazer história de novo. Se o país está tendo essa crise ética ao ponto de se cogitar eleger como presidente da República alguém que foi condenado criminalmente em três instâncias e depois beneficiado por um erro judiciário, então o Paraná pode mostrar algo diferente, pode mostrar que gente não compactua com esse tipo de corrupção, que a gente não compactua com crime. A gente quer uma política diferente e é isso que eu quero construir. Tenho sido, sim, procurado por muitas pessoas, tanto da sociedade civil como do setor privado e empresarial, como também do mundo político, para a gente buscar essa construção dentro do União Brasil, mas também algo até suprapartidário. Eu acho que esse é o ponto talvez mais importante. Eu conheço o governador Ratinho Junior, tenho uma relação cordial com ele. Respeito ele, evidentemente, e ele tem o projeto dele. Eu tenho o meu projeto aqui e nós vamos ainda provavelmente conversar em algum momento.
Então a gente vai ter que esperar o período das convenções partidárias para acabar com essa atmosfera de suspense, como disse o senhor? Como a gente falou, esquentou o nosso clima.
Isso é bom, isso é bom. Será algo positivo a revelar ao Paraná, que tem esse potencial. Muitas vezes ele acaba sendo – não me entendam mal – sendo colocado um pouco de lado dentro da política nacional. Então, é bom que eu tenha vindo para cá e isso mexa um pouco e voltem os olhos novamente da atenção do país para o que vai acontecer no Paraná. E eu acho que, independentemente do que pode acontecer na política nacional, o Paraná pode dar uma lição positiva a mostrar o que a gente quer, uma política diferente. Vamos colocar representantes no Executivo que defendam algo diferente. Se a gente está tendo problemas na nossa economia, que não está crescendo, o Paraná pode fazer algo diferente e se transformar não só num celeiro de alimentos para o país, mas num celeiro de tecnologia. Tem muito espaço para modernizar o estado. É claro que o ideal seria modernizar o país, mas há muito espaço para modernizar o estado com políticas locais ou trabalhando isso no cenário nacional a partir do Paraná. É bom lembrar que a minha esposa continua em São Paulo com o domicílio eleitoral dela. E pode ser que ela se candidate a São Paulo e vai representar minha voz, além dos princípios e valores dela. Importante destacar aqui que a decisão é dela. Ela é que vai tomar essa decisão. Ela tem todo um histórico profissional relevante na advocacia vinculado a causas extremamente significativas para a população, das pessoas com doenças raras e causas de pessoas com deficiência. As pessoas mais vulneráveis da sociedade precisam ter uma atenção especial de políticas públicas e isso é um pouco o trabalho da vida dela. Além de ela ser uma pessoa que já mostrou o seu valor até a nível nacional, porque ela sempre foi aquele amparo para que a gente pudesse defender, trabalhar na Lava Jato e combater a corrupção.
No cenário nacional, o senhor foi um dos nomes que tentou criar a dita terceira via, um centro democrático está sendo chamado agora. Por que essa terceira via não se consolidou até agora? Sergio Moro não vingou, João Doria não vingou, Eduardo Leite não vingou e outros tantos que tentaram ser esse nome para romper a polarização, até agora não conseguiram.
Antes de eu colocar meu nome à disposição, muita gente me dizia que essa eleição é da polarização. Então, não adianta você fazer isso. Mas tinha uma esperança. Política não é exatamente uma ciência exata. Havia uma expectativa. Havia uma esperança que se pudesse romper essa polarização, porque quando o Brasil se radicaliza entre os extremos, isso nos divide e não nos une. Então tentamos, fizemos o que era possível e teríamos prosseguido até o fim se tivéssemos tido o apoio partidário antes da mudança de partido. Acho que esse período daqui a vários anos vai ser estudado e isso vai talvez ser atribuído a uma espécie de cegueira da população. Porque eu, sinceramente, acho que é muito ruim para o país essa polarização acentuada. Vamos apostar que ainda existem candidaturas da terceira via, no caso do próprio União Brasil, do Luciano Bivar. Que haja uma chance dela prosperar. Mas, caso isso não ocorra, lembrar que o Brasil não se resume à presidência. Nós temos Congresso, nós temos os governos estaduais que podem ter uma resistência a essa radicalização e podem ser também instrumentos de transformação do país, além de uma sociedade civil e de um setor privado independentes. Não é tudo dependente do presidente da República, mas assistir a essa acentuação e solidificação da polarização me causa um certo assombro e uma certa tristeza.
Faltou união dessa terceira via? Alguns desses candidatos que acabaram inviabilizados foram, de certa forma, internamente sabotados. Hoje temos o MDB e o PSDB que conseguiram, enfim, formalizar uma aliança. Mas mesmo dentro do MDB, não há 100% de apoio à candidatura da Simone Tebet. E aí tem a pré-candidatura do Bivar pelo União Brasil, a pré-candidatura do Ciro Gomes pelo PDT…
Sim, eu concordo com sua avaliação. Faltou mais união do mundo político que refletisse essa aspiração da sociedade para que houvesse uma candidatura única de terceira via. Infelizmente, isso não aconteceu nem em torno de mim, nem em torno de outros potenciais candidatos, como o próprio João Doria, governador de São Paulo, que também não conseguiu as alianças necessárias para poder se viabilizar como um candidato da terceira via. Boa parte do mundo político está confortável com a polarização porque não vê tantas diferenças entre os dois candidatos, salvo do ponto de vista ideológico. Do ponto de vista político, para alguns é como se fosse atravessar a rua. Para o país, no entanto, eu acho que se confirmar a polarização (e eu espero que isso não aconteça) serão quatro anos bastante difíceis.
A gente continua vendo colocadas dúvidas ao sistema eleitoral brasileiro. Como o senhor avalia o impacto disso e para o próprio resultado de outubro?
Eu não acredito que haja alguma solução fora das eleições, que haja alguma espécie de supressão das eleições ou alguma espécie de golpe. Claro que seria melhor se nós não tivéssemos esse tipo de preocupação. Quando você tem essa polarização, esse é um outro efeito colateral ruim. Ao invés de as eleições serem vistas como o momento em que o país pode ser unificado, pode ser um momento de transição de um governo para outro ou continuidade de um governo com uma espécie de pacificação, no fundo é um momento que aprofunda a cisão. Por isso, quem quer que seja o vencedor, em 2022, dentro desse cenário polarizado, vai ter muita dificuldade.
Falta uma responsabilização maior para quem divulga informações falsas sobre o sistema eleitoral brasileiro?
Isso tem que ser muito bem avaliado dentro da lei, dentro das regras, para que também não se violem os limites da liberdade de expressão. Particularmente, sou uma pessoa institucional. Eu tenho críticas, faço crítica às instituições. Por exemplo, em relação aos retrocessos que tivemos no combate à corrupção, para mim eles são muito claros e eu não me abstenho de fazer essas críticas. Mas eu sempre entendi que o caminho é melhorar as leis e as instituições. Não existe uma saída revolucionária ou fora da lei para resolver essas questões. Tem que se tomar um certo cuidado apenas em relação aos remédios para que nós também não entremos num ambiente de censura. Eu particularmente entendo pela confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro. As urnas eletrônicas nunca foram colocadas em questionamento desde 1996 e não vejo por que colocá-las agora. O que não nos impede, porém, de discutir maneiras de aprimorar. Se tem esses questionamentos, a gente pode demandar maneiras de melhorar isso. Neste ano, não existe mais tempo hábil para mexer nesse mecanismo. Então, que se faça isso para o futuro, para evitar qualquer espécie de questionamento. O sistema, até o momento, se mostrou suficientemente confiável.
Para encerrar, falando em urna eletrônica: o eleitor paranaense que quiser votar no Sergio Moro vai apertar dois, três ou quatro dígitos?
Olha só (risos). É uma pegadinha, não? No momento próprio, isso vai ser definido. Não tenho como antecipar essa decisão, mas posso reiterar uma coisa: eu estou muito feliz de estar aqui e de dar essa oportunidade para o povo paranaense poder apertar essas teclas e fazer essa escolha em outubro.
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¹Pesquisa PoderData, divulgada em 8 de junho, feita com recursos próprios, que ouviu 3 mil eleitores em 309 municípios das 27 unidades da federação entre os dias 5 a 7 de junho de 2022. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos e o nível de confiança é de 95%. Foi registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o número BR-01975/2022.
² Pesquisa Ipespe, divulgada em 25 de março, realizada entre os dias 21 e 23 de março de 2022, a pedido da XP Investimentos. A amostra é de mil eleitores brasileiros, a margem de erro é de 3,2 pontos percentuais para mais ou para menos e o nível de confiança é de 95%. O levantamento está registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o protocolo BR-04222/2022.
Gazeta do Povo