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Máfia das apostas atuou para manipular jogo do Flamengo dentro do Maracanã

Foto: Reprodução

A partida já não valia mais nada. Era a última rodada do Campeonato Brasileiro de 2022. O Avaí, de Santa Catarina, estava rebaixado. O Flamengo só cumpria tabela. Mas havia uma atmosfera especial no Maracanã, templo máximo do futebol brasileiro, porque era a despedida de dois ídolos rubro-negros, Diego Alves e Diego Ribas, integrantes do time multicampeão que empilhou títulos a partir de 2019, sob o comando do técnico Jorge Jesus.

Nos bastidores, porém, a quadrilha recém-descoberta que aliciava jogadores para manipular partidas e ganhar dinheiro em sites de apostas se movia intensamente. Queria fazer daquele jogo despretensioso, na tarde do sábado 12 de novembro, uma oportunidade de faturar alto. Sim: a máfia das apostas tentou manipular uma partida do Flamengo, em pleno Maracanã, na divisão mais importante do campeonato nacional.

As evidências da tentativa de manipulação estão em uma série de documentos, obtidos com exclusividade pela coluna, que constam da investigação na qual o Ministério Público de Goiás tenta mapear e punir criminalmente os envolvidos nas fraudes.

Os prints reunidos pelos investigadores são só o começo. A partir deles, descobrimos que a trama não ficou apenas nas mensagens trocadas entre os suspeitos de integrar a quadrilha. Seguindo à risca o plano que aparece desenhado nos diálogos, um emissário do grupo chegou a visitar o hotel onde a delegação do Avaí estava hospedada, na orla do Rio, horas antes da partida.

As mensagens que tratam desse jogo, especificamente, estão perdidas em meio ao amontoado de indícios coletados durante a fase ostensiva da investigação. Não é possível saber, até o momento, se o episódio está sendo esquadrinhado pelos promotores encarregados do caso. Se não está, certamente merecerá uma atenção especial. Até porque, nessa mesma partida, há pelo menos mais um outro indício que, de alguma forma, se conecta com as mensagens e precisará ser averiguado com lupa.

É o caso de um gol contra bizarro marcado por um zagueiro do Avaí (veja abaixo). Até então, apesar da situação um tanto inusitada, parecia um acidente de percurso. Mas, diante da eloquência das mensagens que agora vêm a público, ainda que se prove depois que não havia conexão nenhuma com o esquema (e até para que não pairem suspeitas indevidas), será fundamental investigar mais detidamente os envolvidos.

As primeiras mensagens relacionadas à partida foram trocadas na véspera. Romário Hugo dos Santos, conhecido como Romarinho, conversa com uma pessoa de nome Beatriz, a quem chama de “amor”. Ex-jogador do Palmeiras, preso desde abril, ele já foi denunciado à Justiça. É apontado como um dos cabeças do esquema, responsável por aliciar jogadores e por financiar os subornos.

Romarinho avisa Beatriz que teria de viajar às pressas, naquela mesma noite, para o Rio de Janeiro (leia as mensagens na galeria). A tarefa a ser cumprida por ele era cirúrgica. Pelo teor do diálogo, o ex-jogador teria um compromisso em São Paulo na manhã do dia seguinte — tanto que ela envia para ele, pouco depois, um bilhete aéreo para retornar à capital paulista ainda na manhã de sábado.

“Vou precisar ir lá no Rio de Janeiro mano”, escreveu, às 20h21. “Eu arrumei uma parada lá pra uns caras aqui. Vou precisa ir lá. (…) Jogador. Vou ganhar agora 150 mil. Mais as apostas”, escreveu. Beatriz reage com estranhamento e faz algumas perguntas. Logo em seguida, o ex-jogador encaminha para ela a mensagem que revela o plano relacionado à partida que seria jogada no dia seguinte no Maracanã.

A própria mensagem, que inclui as coordenadas para a “missão” a ser cumprida por Romarinho no Rio e menciona uma recompensa de R$ 800 mil adiantados “no pix”, se refere à trama como “Operação Avaí x Flamengo”.

Diz o texto:

“OPERAÇÃO AVAÍ x FLAMENGO

2 zagueiros e 1 Goleiro

TOMAR 5 GOLS

R$ 800.000,00 Adiantado!

No pix, na hora.

Encontrar MARLON (meu fechamento) junto aos jogadores, no HOTEL HILTON COPACABANA às 7:00 da manhã!”

A mensagem dá a entender que Romarinho era o emissário escolhido pelo grupo das apostas para levar adiante uma operação que já havia sido previamente combinada por uma terceira pessoa, que não aparece identificada no diálogo.

Os R$ 800 mil seriam a comissão, adiantada, a ser paga a quem topasse participar da empreitada, que novamente de acordo com a mensagem envolveria dois zagueiros e um goleiro um objetivo: “tomar cinco gols”. Nesses exatos termos, porém, o objetivo não chegou a ser alcançado. O Avaí acabou ganhando do Flamengo por 2 a 1. Não se sabe, porém, se havia outras “metas” que interessavam aos integrantes da máfia e poderiam resultar em ganhos nos sites de aposta.

A coluna apurou, a partir do cruzamento de dados como números de telefone, que o tal Marlon com quem Romarinho deveria se encontrar no hotel é Marlon Bruno Nascimento da Silva, um ex-jogador de futebol de 27 anos com passagens por pequenos clubes brasileiros. Apurou também que o Hilton Copacabana, um cinco estrelas localizado entre Copacabana e o Leme, na orla carioca, é exatamente o hotel onde a delegação do Avaí estava hospedada no Rio.

Procurado, Marlon confirmou que esteve na manhã de 12 de novembro, dia do jogo, no hotel. Disse que foi encontrar “um amigo”. “Fui falar com um amigo meu que tava (sic) lá”, disse. Ele negou que tenha ido ao local para falar com jogadores do Avaí. Diante da insistência das perguntas, desligou o telefone. Em nota, o Avaí diz não ter qualquer relação com Marlon Bruno.

O gol contra

Só as investigações poderão esclarecer se há alguma relação com as mensagens colhidas pelos investigadores, mas agora, com a descoberta da trama envolvendo a partida, chama atenção um gol contra marcado por Wellington Ferreira Nascimento, um dos zagueiros do Avaí.

O jogador, que está até hoje no clube catarinense, abriu o placar aos 42 minutos do primeiro tempo. Em um cruzamento de Vidal, do Flamengo, o zagueiro avança sobre a bola e cabeceia para dentro do próprio gol. Minutos depois, o Avaí fez 1 a 1. Já no final do segundo, virou o placar.

O Avaí e as suspeitas

Não é a primeira vez que jogadores do Avaí aparecem relacionados. O clube já sofreu duas baixas em razão do escândalo. Dois jogadores estão afastados atualmente: Raphael Rodrigues e Vinícius José Ignácio, conhecido como Didi, ambos zagueiros.

O nome de Raphael aparece em uma tabela com valores de supostos pagamentos. Além disso, em um áudio enviado por aplicativo de mensagem em outubro do ano passado, um dos participantes da quadrilha fala em “os vinte do Raphael do Avaí”. Na semana passada, o Avaí afastou Didi, também mencionado nas investigações por ter conversado com um dos operadores do esquema.

Investigações prosseguem

O Ministério Público de Goiás já apresentou acusação formal à Justiça contra 26 participantes do esquema, incluindo jogadores e responsáveis pelas apostas fraudulentas.

Na denúncia, os promotores afirmam que o grupo atuou para manipular pelo menos 16 jogos, todos do segundo semestre de 2022 para cá. Ao menos 11 jogadores foram afastados por seus times e sete foram demitidos. Nesta semana, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva, o STJD, suspendeu por 30 dias oito dos atletas envolvidos. As investigações prosseguem.

O que dizem os envolvidos

Na nota enviada nesta tarde à coluna, o Avaí afirmou que nunca tomou conhecimento de qualquer tentativa de manipulação da partida contra o Flamengo e ressaltou que afastou dois jogadores mencionados nas investigações. O clube disse ainda que nunca teve relação com Marlon Bruno, a pessoa que de acordo com a mensagem Romarinho deveria encontrar no hotel onde estava hospedado o time.

O clube afirmou também que desconhece a existência de qualquer relação entre Marlon e os seus atletas, dirigentes e integrantes da comissão técnica. “O Avaí não foi acionado judicialmente a se manifestar sobre o assunto e, se assim ocorrer, irá prestar os esclarecimentos”, diz o texto. “Também estamos estudando medidas judiciais para resguardar o clube de possíveis danos”, prossegue.

Em nota divulgada após a deflagração da segunda fase da Operação Penalidade Máxima, como foi batizada a investigação do Ministério Público, a defesa de Romarinho afirmou que o ex-jogador é inocente.

O zagueiro Wellington Ferreira, autor do gol contra na partida contra o Flamengo, também foi procurado por meio da equipe de comunicação do Avaí, mas não respondeu às perguntas até a publicação desta reportagem.

Metrópoles 

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Written by MOSSORÓ NEWS

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