O plano de governo apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) deixou clara a estratégia da campanha presidencial de buscar o voto das mulheres. Ao longo das 48 páginas do documento, há a menção sobre elas em 43 ocasiões, entre citações sobre “mulheres”, “mães” e programas voltados para esse segmento social. São citadas ações feitas para o eleitorado feminino ao longo da gestão e destacados compromissos para o caso de ser reeleito.
O plano apresenta propostas nas áreas de segurança pública, saúde, educação e geração de emprego e renda especificamente para mulheres. Falas e agendas recentes recentes do presidente também evidenciam os gestos e a prioridade estratégica em relação a esse público.
Segundo dados de julho do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 53% do eleitorado é composto de mulheres – ou 82,4 milhões de eleitoras. E, ao contrário do eleitorado masculino, Bolsonaro tem um desempenho pior em relação às mulheres.
A última pesquisa Genial/Quaest, por exemplo, mostra que o presidente tem 28% das intenções de voto entre o eleitorado feminino, enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem 46%. Entre os homens, Bolsonaro teve 36%, e Lula marcou 43%. A pesquisa também aponta que o governo é rejeitado por 48% das mulheres e aprovado por 24%. Já entre os homens, 37% rejeitam sua gestão e 32% aprovam.
Coordenadores da campanha do presidente reconhecem que o eleitorado feminino é um dos grupos em que Bolsonaro tem mais dificuldades.
Quais as estratégias de Bolsonaro para conseguir votos das mulheres
Para ampliar a adesão das mulheres, Bolsonaro tem adotado gestos recentes. Na terça-feira (9), participou do lançamento do programa “Caixa pra Elas” – projeto da Caixa Econômica Federal que propõe atendimento ao público feminino para incentivar e dar oportunidades às mulheres por meio de promoção do empreendedorismo, de educação financeira e orientação sobre prevenção à violência.
No discurso, enalteceu o trabalho da ex-ministra Damares Alves no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. E fez críticas a políticas dos governos do PT para a família e as mulheres.
Bolsonaro também tem feito outros gestos que enalteçam o papel das mulheres. Um que passou a ser utilizado por ele em discursos é destacar que, dos 370 mil títulos de terra concedidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), 90% foram destinados a mulheres. “Homem no meu governo só tem título [de terra] se ele for solteiro ou viúvo. Sendo casado ou vivendo em união estável, o título vai para elas. Elas sabem melhor cuidar desse negócio”, declarou Bolsonaro no lançamento de sua candidatura, durante a convenção nacional do PL.
No mesmo evento, sua mulher, a primeira-dama Michelle Bolsonaro, fez um discurso voltado às eleitoras. Ela disse que seu governo dedicou muita atenção ao público feminino. “Falam que ele não gosta de mulheres. E ele foi o presidente da história que mais sancionou leis para a proteção das mulheres: 70 leis”, declarou.
A primeira-dama também destacou que Bolsonaro foi o responsável por ter sancionado a lei que dá direito às mães de filhos com microcefalia a receber o Benefício de Prestação Continuada (BPC). “Ele está cuidando de uma mulher mãe. Quando ele cuida de uma criança rara, ele está cuidando de uma mulher mãe”, destacou.
Michelle também fez referência à conclusão da obra da transposição do Rio São Francisco em um tom voltado para as mulheres. “Quando ele leva água para o Nordeste, ele está cuidando da mãe dona de casa, a mãe que leva o balde ali, [com] a bacia na cabeça para fazer o alimento e dar banho nos seus filhos. Esse é o presidente que falam que não gosta de mulheres”, declarou.
O que diz o plano de governo sobre as mães
As estratégias de comunicação de Bolsonaro e sua campanha ao apostar em falas sobre família e na figura da mãe estão alinhadas com as propostas de seu plano de governo para conseguir os votos das mulheres . O “eixo” voltado para a saúde, educação e o social consiste em várias políticas públicas voltadas para as famílias e mulheres.
O plano de governo expressa que a família é a “célula ou base da sociedade”, destaca “a defesa do direito e o fortalecimento dos vínculos familiares e intergeracionais” e “compreende o papel da mulher na sociedade moderna”. “Afinal, cabe a elas chefiar cerca de 50% das famílias no Brasil”, diz um trecho do documento.
O programa de governo aborda que, na família, crianças, adolescentes, pessoas idosas e com deficiência, “além de mulheres”, devem receber “atenção especial”. O plano sustenta que o governo foi o que mais investiu na proteção desses públicos e na inclusão das mulheres no mercado de trabalho e no empreendedorismo “com igualdade de condições” aos homens.
Somente em 2021, destaca o plano de governo, foram mais de R$ 236 bilhões investidos em políticas públicas para mulheres de todas as faixas etárias e com deficiência, “por meio de ações transversais e integradas de todos os ministérios”.
Uma das ações destacadas é o Programa Mães do Brasil, que foi proposto para promover a dignidade da mulher no exercício da maternidade. Segundo a campanha, o programa tem por objetivo “reconhecer o valor da maternidade para o bem comum, a fim de amparar as mulheres no exercício integral da maternidade, desde a concepção até o cuidado com os filhos. “Além de fomentar a inserção e a reinserção das mulheres mães no mercado de trabalho, a conciliação trabalho-família e a equidade e corresponsabilidade no lar”, destaca.
Uma das promessas feitas por Bolsonaro caso seja reeleito é “ampliar” e “consolidar” ações que visam fortalecer os vínculos familiares e entre gerações “dentro da ideia de que os pais são os principais atores na educação das crianças, e não o Estado, e de que famílias fortes são a base de nações fortes”.
Outras promessas de Bolsonaro em busca do voto das mulheres
Além das promessas voltadas às mães, o plano de governo de Bolsonaro também assume compromissos mais diretos a todas as mulheres. A começar pela pauta econômica voltada ao eleitorado feminino. O programa de governo fala em avançar na agenda de empregabilidade de jovens e mulheres, públicos que “ainda sofrem com taxas de desemprego mais altas que a média da população”.
Um dos objetivos é investir na agenda de empreendedorismo e microcrédito para os mais vulneráveis. É destacado como exemplo o Programa SIM Digital, que emprestou mais de R$ 2 bilhões para 2,8 milhões de microempresários, dos quais 63% são mulheres.
O programa de governo também fala sobre a implantação de políticas públicas voltadas para a inserção do jovem e da mulher no mercado de trabalho “de forma justa e assertiva”, a fim de assegurar a “igualdade de salários entre homens e mulheres que desempenham a mesma ocupação laboral e a possibilidade de equilibrar, até mesmo por meio do trabalho híbrido ou home office, a difícil tarefa de cuidar dos filhos e prover sustento”.
A fim de tornar realidade esses compromissos, o programa de governo fala em “reforçar” ações de programas como: o “Brasil pra Elas, a estratégia nacional de fomento ao empreendedorismo feminino para o desenvolvimento socioeconômico o qual está inserido o Caixa pra Elas; o Qualifica Mulher, que prevê a capacitação profissional, empreendedorismo e fomento por linhas de crédito; e o Emprega Mais Mulher, de estímulo à empregabilidade e à flexibilização do regime de trabalho”.
Dentro da linha de empreendedorismo como “ferramenta de transformação” das mulheres, a campanha também fala em reforçar ações de ampliação de creches no contraturno escolar. Também fala em promover a capacitação para aumentar a participação das mulheres na política, sendo citado o Parlamento.
Na área da saúde, as mulheres são citadas em um trecho sobre a promessa de ampliar a oferta de saneamento básico para a população com “metas ousadas” que propiciem maior bem-estar e redução do índice de doenças. “A revolução que está sendo feita no saneamento terá diversos efeitos positivos para a vida do brasileiro, pois ela aumenta a matrícula na escola primária, reduzindo dias letivos perdidos pelas crianças, aumenta a produtividade entre os adultos e proporciona segurança às mulheres”, diz um trecho do plano de governo.
Na área da segurança pública, a proposta promete fortalecer as ações do Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio, programa que visa garantir direitos e promover a assistência integral humanizada e não “revitimizadora” às mulheres vítimas de violência. Para isso, o plano de governo promete fortalecer a rede de proteção e manter a reformulação do projeto da Casa da Mulher Brasileira, criado para oferecer um atendimento humanizado às mulheres vítimas de violência doméstica.
Atualmente, nove “casas” do projeto estão em construção e outras 20 estão contratadas e em fase de implantação. Caso seja reeleito, Bolsonaro promete consolidar e ampliar as ações do projeto, “também com a sua interiorização, tornando o país um lugar seguro, solidário e inclusivo para os nossos filhos”.
Como a segurança pública às mulheres se destaca em relação ao plano de 2018
A importância dada às mulheres nas 43 citações e referências ao longo do plano de governo de Bolsonaro é ainda mais significativa quando comparada ao programa de 2018, quando havia apenas três menções ao longo de 81 páginas. Entre todos os eixos da proposta de 2022, a segurança pública é o principal destaque.
Diferentemente da pré-campanha em 2018 e durante a corrida eleitoral, quando Bolsonaro pregava o combate à criminalidade e o fim dos homicídios sem distinção para homens e mulheres, as promessas de combate ao feminicídio são uma diferença em relação aos compromissos de quatro anos atrás.
Em 2017, por exemplo, quando ainda era deputado federal, Bolsonaro pregou o fim do “mimimi’ do feminicídio”. Em sua proposta de reeleição, o Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio é destacado em duas ocasiões. Além disso, é destacado que o governo ampliou as ações de proteção focalizadas nos grupos mais vulneráveis à violência, “como mulheres, crianças, adolescentes e pessoas idosas”. “Além de investir no combate a homicídios e ao feminicídio, com resultados positivos já observados”, diz um trecho.
Também há ênfase no enfrentamento à violência contra as mulheres ao comentar o aumento “expressivo” de casos durante a pandemia de Covid-19. “O governo federal atuou por meio da ampliação de ferramentas vinculadas ao canal de denúncia Ligue 180 (WhatsApp, Telegram e aplicativo DH Brasil) e da articulação com governos estaduais e municipais, no sentido de coibir essa prática nefasta. Em 2021, o governo lançou o Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio, com o propósito de fortalecer a rede de proteção das mulheres”, aponta outro trecho.
No plano de governo de 2018, as mulheres eram citadas em duas ocasiões ao destacar importância de prevenção da saúde com exemplos sobre saúde bucal e o bem-estar da gestante. A outra referência ocorre no trecho em defesa ao combate ao estupro de mulheres e crianças.
Gazeta do Povo