Trinta e dois trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão no Rio Grande do Norte em 2022, em operações conduzidas pelos grupos móveis de fiscalização que contam com a atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT). Entre 2019 e 2021, foram 29 resgatados no RN.
Integram os grupos a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego, o MPT, o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU), a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), dentre outros órgãos.
Em todo o Brasil, foram 2.575 trabalhadores resgatados dessas condições em 2022. De acordo com dados da SIT, os trabalhadores resgatados no RN receberam, em verbas rescisórias, pouco mais de R$ 12 mil.
Felipe Guerra é o município com mais autos de infração lavrados após a constatação de situações de trabalho análogo a de escravo: submissão a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, sujeição a condições degradantes de trabalho, ou com restrição, por qualquer meio, de sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
“Os números em si não revelam a gravidade do caso, uma vez que para cada pessoa resgatada existem inúmeras ignoradas seja pela ausência de denúncias, fiscalização insuficiente ou mesmo por não se enxergarem naquela situação”, destaca o procurador do Trabalho Gleydson Gadelha, titular, no RN, da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete).
Para lembrar o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Escravo, transcorrido neste sábado, 28, o MPT promoveu uma série de ações de conscientização sobre o crime em todo o país. A Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo do Rio de Janeiro (Coetrae-RJ) e o MPT-RJ lançaram manual para jornalistas sobre como comunicar o assunto. A iniciativa foi desenvolvida a partir da demanda por segurança apresentada pelas pessoas resgatadas e da necessidade das organizações e dos profissionais que prestam os atendimentos em preservar o sigilo de informações sensíveis.
Migração em busca de emprego
No fim de 2022, duas operações realizadas em outros estados resgataram potiguares e acenderam a luz de alerta sobre a vulnerabilidade dos norte-rio-grandenses diante dessa grave violação de direitos humanos. 28 trabalhadores que estavam sendo submetidos a condições degradantes de trabalho e mediante servidão por dívida foram resgatados em um laranjal, no município de Ubirajara, em São Paulo.
“Ao lado de todas as carências que levam à subnotificação dos casos, o estado do RN tem se mantido como um grande fornecedor de mão de obra escravo para todo o país. Nesse sentido, aumentaram os casos de resgate noutros estados com retorno desses trabalhadores e trabalhadoras para suas cidades de origem em terra potiguar”, destaca Gadelha.
Os trabalhadores foram arregimentados em Guamaré, em setembro. Diante de péssimas condições, conseguiram retornar ao RN em novembro, após pedirem ajuda a conterrâneos para custeio da viagem de volta.
Em um segundo caso, doze potiguares de São Gonçalo do Amarante foram resgatados de uma pedreira localizada no município de São João da Baliza, em Roraima, onde igualmente eram submetidos a condições degradantes de trabalho. O barracão onde dormiam abrigava dez pessoas e era utilizado para descanso coletivo, guardar alimentos, preparar a comida e fazer refeições. Sem banheiros, os trabalhadores tomavam banho em uma estrutura envolta por lonas, com água coletada de um poço e com baldes reaproveitados de embalagens de óleo. Os trabalhadores também não tinham acesso à água potável e dormiam no meio das galinhas.
Segundo o Grupo Especial de Fiscalização Móvel, ainda havia o risco de acidentes com animais da mata, como cobras, aranhas e escorpiões. Os trabalhadores potiguares quebravam manualmente e artesanalmente pedras para fabricação de paralelepípedos, utilizadas em obras de construção civil pesada em Roraima.
Trabalho escravo doméstico
Em janeiro de 2022, uma ação conjunta resgatou duas trabalhadoras domésticas de condições análogas à escravidão, em Mossoró e em Natal. As ocorrências foram as primeiras relativas a trabalho doméstico em 27 anos de registro de casos dessa natureza no RN.
No resgate realizado em Natal, a equipe constatou que a empregada doméstica trabalhava havia cinco anos na residência, de segunda-feira a domingo, ficando à disposição da empregadora 24 horas por dia e descansando apenas a cada 15 dias.
Também se constatou que a vítima havia gozado férias uma única vez e que trabalhava normalmente nos feriados.
No resgate realizado em Mossoró, a trabalhadora também fora submetida a abuso sexual por parte do empregador.
Data
O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo foi criado em homenagem aos auditores-fiscais do Trabalho Nélson José da Silva, João Batista Soares Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves, além do motorista Aílton Pereira de Oliveira, que foram assassinados em Unaí, no dia 28 de janeiro de 2004, quando investigavam denúncias de trabalho escravo em uma das fazendas de Norberto Mânica. O episódio ficou conhecido como a chacina de Unaí.
*Com informações do Jornal de Fato